De acordo com uma declaração recente da UNESCO, o futuro é incerto. Mudanças climáticas, pandemias, crise econômica, exclusão social, racismo, opressão das mulheres, conflito entre gerações e muitos outros problemas abalam as imagens que temos do futuro.
E esse não é um problema de menor importância. Sem imagens do futuro que inspirem esperança e fomentem a colaboração, existe um grande risco de que haja desespero e guerra. Assim, a falta de imaginação de um futuro melhor precisa ser superada.
Contudo, o problema é: como prever possíveis futuros?
Quais são as habilidades futuras essenciais que todos devem ter neste momento de nossa existência humana?
Todas as empresas e organizações constantemente fazem previsões e estudam tendências para tomar decisões informadas sobre o que está por vir. Atualmente, há um grupo de designers que está liderando este campo, usando habilidades multidisciplinares de design.
A Echos está liderando esse movimento, abordando com ênfase essas habilidades raras, mas essenciais, no programa DESIGN DE FUTUROS.
Conversei com André Arruda, um dos líderes deste programa, para entender exatamente o que é o DESIGN DE FUTUROS e por que as empresas devem embarcar nesse conceito com urgência.
Saiba mais sobre o André
Kehinde: Como você criou o Design de Futuros?
André: Minha formação é em design industrial. Me formei em design industrial no Brasil. Depois disso, me especializei em design estratégico. Isso foi em 2012, mais ou menos, e fiz meu mestrado em cenários prospectivos. Por dois anos, tive que estudar e me aprofundar nas áreas que estudam futuros. Trabalhei e coordenei um plano de longo prazo para minha cidade nesta área, construindo futuros prospectivos para as cidades num plano de longo prazo. Desde o ano passado, trabalho aqui na Echos como líder de design estratégico e coordeno o curso de Design de Futuros no Brasil.
Kehinde: O que realmente inspirou você a fazer isso? Você quer ser um “profeta”, prevendo o futuro?
André: Boa pergunta. Sempre conto essa história aos meus alunos. Um dia, vi uma notícia no jornal em que diziam que meu município queria construir uma visão para os próximos vinte anos para a cidade. Eu já estava envolvido com projetos nessa área de trabalho. Naturalmente, eu quis ver como poderia criar, facilitar ou fazer parte dessa visão. Então peguei essa notícia e mandei para o meu grupo de professores/pesquisadores e para um amigo meu no Brasil, e foi assim que começou.
Kehinde: Você é uma pessoa visionária…
André: Gosto de procurar novas oportunidades.
Kehinde: a UNESCO diz que o conhecimento e a alfabetização para futuros se tornarão habilidades essenciais para o século 21. O que isso significa e por que é importante?
André: Acho que isso começou a ter mais relevância durante a pandemia. Antes mesmo da pandemia, a UNESCO começou a trabalhar na alfabetização para futuros. Essa é uma grande oportunidade em que empresas e organizações começam a construir uma visão madura para o futuro.
Por exemplo, que tipo de produto ou serviço precisamos preparar para o longo prazo?
Porque agora, mais do que nunca, a tecnologia evolui a cada ano e as empresas precisam se preparar para essas mudanças, mapeando esses cenários futuros com o que chamamos de curingas. Em resumo, acredito que agora, mais do que nunca, as organizações estão mais interessadas em construir essas visões de longo prazo e serem mais adaptáveis a diferentes cenários.
Kehinde: Interessante. Então, como podemos usar o design para isso? Porque soa mais como estratégia. Como o design é considerado parte do design de futuros? Eu sei que existe design especulativo e outros tipos, mas por que design de futuros?
André: Eu diria que uma abordagem de design centrada no ser humano pode ser mais benéfica para essas perspectivas futuras. Na minha opinião, as áreas de futuros estão mais relacionadas com filosofia estratégica, econômica, política ou social. Adicione a isso a abordagem de design centrado no ser humano – design thinking, perspectiva empática, entrevistas aprofundadas, pesquisas mais profundas etc. – e poderemos construir esses futuros.
Fazemos isso usando diferentes ferramentas, metodologias e processos. Então, o que geralmente fazemos é criar vários workshops reunindo diferentes métodos ou ferramentas. Não só da futurologia, mas também da área de design para construir algo relevante para os nossos clientes.
Kehinde: Você poderia me dar um exemplo de como isso funcionou antes? Um estudo de caso?
André: Na verdade, essa é uma das minhas tarefas para o ano que vem: construir um manual – ainda não sabemos que tipo de material seria – para construir o futuro para a indústria de alimentos. Por exemplo, estamos trabalhando com um cliente aqui no Brasil chamado Ajinomoto. Eles têm mais de 100 anos trabalhando nesta área e querem entender como a geração mais jovem vê o futuro da indústria de alimentos.
Fizemos muitas pesquisas, entrevistas aprofundadas, pesquisas qualitativas. Depois disso, criamos um workshop junto com o cliente e começamos a facilitar diferentes ferramentas. Por exemplo, construímos a visão de futuro da empresa sobre a indústria de alimentos. Em seguida, começamos a criar diferentes cenários e mapas de tendências relacionados à tecnologia, cultura, comportamento e, especificamente, ao público brasileiro.
Este é um exemplo. Agora, estamos pensando na indústria farmacêutica. Eles queriam entender qual seria o futuro da indústria farmacêutica. Então, agora estamos aplicando nosso curso de trabalho – estamos criando diferentes cenários, criando este mapa de tendência e verificando os sinais fracos.
O próximo passo seria criar uma estratégia de perspectiva de longo prazo sobre esse setor. Nesse caso, normalmente dependemos das áreas de interesse do nosso cliente. Neste ano, trabalhamos com gestão doméstica, indústria de alimentos, ecossistemas de inovação e indústria farmacêutica. A ideia, claro, é compartilhar essas perspectivas: o que criamos, trazer novos clientes e consolidar essas perspectivas.
Kehinde: Por que executivos e diretores devem considerar o design de futuros uma questão urgente?
Confira as cinco razões pelas quais precisamos tratar o design de futuros como uma questão urgente
- Revolução tecnológica
Temos a tendência de pensar sobre futuros de uma perspectiva tecnológica porque isso faz parte de nossas vidas. É assim que percebemos mais claramente as mudanças exponenciais que impactam nosso contexto cotidiano. O ritmo de evolução da tecnologia neste início de século, visto pela curva tecnológica do Gartner, demonstrou os principais momentos de adoção da tecnologia.
Ainda assim, atualmente, o ciclo das novas tecnologias tem diminuído a cada ano, fazendo com que novas soluções apareçam quase simultaneamente em diferentes territórios. Esse monitoramento em tempo real é excepcionalmente desafiador.
Ao mesmo tempo, vislumbramos o momento em que a singularidade tecnológica está cada vez mais perto de nos atingir, com a adoção de soluções como 5G, blockchain, computação quântica, miniaturização de componentes, satélites de baixo custo, viagens espaciais, permitindo-nos ser cada vez mais ousados nesta visão de futuro.
- Nova geração / alinhamento cultural com a nova geração
Quando falamos sobre futuros, estamos inconscientemente pensando para quem vamos
construir essas visões, e precisamos levar em consideração não só a questão tecnológica, mas também outros aspectos culturais, sociais e comportamentais para que não haja lacunas entre futuros desejáveis e o público que viverá nesses futuros.
Nesse sentido, é imprescindível que entendamos mais sobre as novas gerações, suas aspirações, para que mundo estão se preparando, bem como o impacto tecnológico e ambiental que irá transformar radicalmente a vida dos jovens nas próximas décadas.
- Certificar-nos de que não estamos deixando a geração mais velha para trás
Quando discutimos futuros, alguns aspectos são mais passíveis de especulação. Ainda assim, também podemos falar sobre algumas tendências irreversíveis. Uma delas é o envelhecimento da população de forma mais saudável.
No futuro, no curto prazo, começaremos a ter cada vez mais populações idosas e uma redução da natalidade. Nesse sentido, teremos que desenvolver estratégias não só para adaptar a visão dos jovens, mas também para criar uma visão inclusiva e um futuro acessível para os idosos.
- Mudanças climáticas
Outra tendência irreversível que seguimos é a questão das mudanças climáticas, que mudarão radicalmente o modo de vida das próximas gerações. Cientistas e pesquisadores já trazem um panorama alarmante de que estamos cada vez mais perto de um ponto sem volta no que diz respeito à questão ambiental. Nesse sentido, que futuro queremos imaginar e construir?
Desde os anos 70, discutimos o conceito de Ecologia Profunda, em que o ser humano não é visto apenas como extrator de recursos, mas como parte de um sistema mais amplo e integrado com o equilíbrio global, em que nossas ações têm impactos diretos e indiretos na questão ambiental. Este é um dos caminhos possíveis para que, no futuro, os seres humanos continuem a existir e sejam capazes de prosperar de forma sustentável.
- COVID-19 e o novo normal
A discussão sobre futuros, apesar de antiga, ganhou novas proporções a partir do contexto pandêmico. E está fazendo com que empresas, setores e instituições em geral evoluam radicalmente seus processos por meio da transformação digital para se manterem ativas.
Atualmente, estamos começando a vislumbrar um novo horizonte. A população vacinada começará a retomar as atividades presencialmente sem perder todo o aprendizado evolutivo dos últimos 17 meses. Nesse sentido, todas as estratégias e visões de curto, médio e longo prazo precisam ser recalibradas para que novas visões sejam mapeadas e futuros desejáveis sejam (re)construídos.