O post de hoje foi escrito por Cesar Matsumoto, que foi um dos professores convidados do curso ENACT – Negócios do Futuro na turma do primeiro semestre. No texto abaixo, ele discute um dos pilares do curso: consciência de propósito, desmistificando o que é o propósito de vida e como lidar com essa busca.
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Estive num encontro de apresentação do curso ENACT (Enabling Action) — Negócios do Futuro da Escola Design Thinking para falar sobre Consciência de Propósito.
Refleti bastante sobre minha caminhada que foi desde sempre uma busca por propósito. Com altos e baixos. Conquistas e frustrações. Do que caminhei, tanto ajudando outros com seu propósito e na busca do meu próprio, listei 5 pontos que julgo pertinentes a saber para uma caminhada de propósito:
1. Cuidado com a ideia de que “você tem que ter um propósito”
Ninguém “tem que” nada. Aliás essa é uma coisa para se abolir de todas as áreas da vida. Se fazemos algo porque “tem que”, então não se está fazendo por vontade própria, não se está fazendo por inteiro.
Ninguém precisa de uma declaração de propósito de vida para viver feliz e pleno. O propósito, como estamos definindo aqui, é um alinhamento com um chamado da vida, que nos conecta com nossos potenciais, à serviço da vida, num processo de crescimento e evolução.
2. Propósito não é algo para preencher um vazio na vida
Nós não buscamos ter propósito para preencher um vazio na vida. Um exemplo análogo é quando estamos solitários e buscamos um parceiro(a) para acabar com a solidão. De duas uma — ou ninguém aparece, ou se aparece, a coisa é desastrosa, porque carência atrai carência.
No lugar de tapar a solidão ou o vazio com alguma coisa externa, sugeriria ir a fundo na compreensão do vazio e/ou da solidão. Por que me sinto vazio/solitário? O que é vazio e solidão para mim? Por que preciso de algo externo para não estar vazio ou solitário? Por que não posso simplesmente me bastar? Tente examinar os pressupostos por trás das crenças que sustentam essa sensação de vazio e solidão. Pode ser útil conversar com alguém de confiança que te escute sem julgamentos.
Persevere nesse entendimento. Pois quanto maior for o vazio e a dor, maior é o potencial escondido de transformação. E isso nos leva ao ponto 3:
3. Propósito é uma jornada de morte e ressureição
Todos nós passamos por momentos na vida onde fazer as coisas como fazíamos antigamente perde seu sabor, perde sentido. A mudança, a evolução é inevitável.
É como um video-game, ou um mito do Herói, quando passamos de fase, novos desafios virão, e aí vamos precisar de novos poderes (conhece a A Jornada do Herói?). Por bem ou por mal, a vida vai nos fazer mudar. Para quê? Para revermos crenças errôneas que nos impedem de realizarmos nossa felicidade e alegria inatas!
Se tudo o mais falhar para revermos nossas crenças, a vida tem um mecanismo que não falha — o sofrimento. Pois em última instância é ele que nos faz parar pra valer e refletir. Não precisamos sofrer para evoluir, mas se o sofrimento vier, saiba que é uma bênção disfarçada.
De acordo com o mitólogo Joseph Campbell, os mitos nas diversas culturas tratam de um tema básico — a morte e ressurreição. Ao longo de nossa vida, algumas coisas sempre têm que morrer para outras poderem nascer. Velhos hábitos, crenças e padrões têm de ficar para trás, para a nova versão de nós vir à tona. Se engajar no propósito é aceitar o chamado da aventura, enfrentar os dragões (nossos medos), morrer para nossa atual identidade, nos perder, para então nos encontrarmos, numa nova identidade, mais sábia, mais plena.
4. Coragem!
Quando nos jogamos no território do desconhecido, do imprevisível, é muito comum termos medo. O medo é o oposto do Amor, sendo que este envolve uma confiança intrínseca no movimento da vida, nas sincronicidades.
A jornada do propósito é um alinhamento com o fluxo da vida. É se tornar mais íntimo com esse território do desconhecido. E a bússola para trafegar nesse território não é a mente, mas o coração.
O coração é a bússola que nos diz para onde ir, e a mente então faz os preparativos da viagem — escolhe o melhor meio de transporte, os suprimentos necessários, etc. E o cuidado passa a ser não deixar a mente controlar, mas servir a direção ordenada pelo coração.
A raiz da palavra coragem é couer (em Latim), que significa coração. Coragem é agir com o coração. Precisamos dela para largar mão do controle e da previsibilidade para nos abrirmos ao que a vida nos pede. Muitas vezes temos que largar mão do nosso planejamento e servir àqueles e àquilo que nos é pedido no momento presente. E numa cadeia de acontecimentos e sincronicidades, o verdadeiro plano vai se revelando.
*Exercício sobre a essência do seu propósito:
Para prosseguirmos ao próximo e último ponto, vou lhe sugerir um exercício. Sem pensar muito, escreva num papel a primeira coisa que lhe vier à cabeça em resposta à seguinte pergunta:
O que você faria de mais especial, caso soubesse que o sucesso é garantido?
Se você se sentiu entusiasmado só de pensar no que gostaria de fazer, então já tem uma conexão com sua bússola. Talvez a forma daquilo que você pensou não seja exatamente o que você quer realmente fazer, mas certamente está conectado com a essência por trás da(s) ideia(s) que teve. Essa essência é que importa, é com ela que caminhamos no propósito e a qual cuidamos para não nos desconectar diante dos pequenos desafios do dia-a-dia.
5. Propósito é um ato de Amor
O que é Amor? Para o sábio J. Krishnamurti,
“Amar é não pedir nada em troca, é nem mesmo sentir que se está oferecendo algo. Somente um amor assim pode conhecer a liberdade. (…) Quando vemos uma pedra pontiaguda em um caminho frequentado por pedestres descalços, nós a retiramos não porque nos pedem, mas porque nos preocupamos com os outros, não importa quem sejam.”
Um ato de amor é como ver uma pessoa que pegou no sono no sofá e sem pensar, cobrimos com um cobertor. Não tem o pensamento “puxa, como sou uma boa pessoa” e nem a expectativa de receber algo em troca. É um ato espontâneo, que combina inteligência, empatia e força de vontade.
Das coisas simples como essa à criar uma empresa com 5000 funcionários voltada ao propósito de melhorar a vida das pessoas, a essência (Amor incondicional) não muda, só a forma.
Servir à vida, com essa qualidade do Amor incondicional, partilhando dos seus melhores presentes, é uma expressão da Felicidade Verdadeira. A jornada do propósito é o próprio fluxo da vida, é a conexão com a essência (que você começou a identificar no exercício do ponto anterior), é o encontro com o Eu.
Mantendo-se fiel à essência, com coragem, partilhando em Amor, a vida se revela no seu esplendor!
Por Cesar Matsumoto: Facilitador de diálogo e cocriação de projetos. Administrador público pela FGV-EAESP e formado em Biopsicologia pelo Instituto Visão Futuro.