Como podemos descobrir o que será possível no futuro? Com pesquisa. Entende-se por pesquisa uma investigação sistemática de materiais e fontes para estabelecer novos fatos e chegar a novas conclusões sobre um tema. A parte complicada de aplicar o processo de pesquisa ao futuro é que não há fatos conhecidos sobre ele e, assim, não é possível tirar conclusões concretas. E ainda assim, os futuristas não apenas realizam pesquisas rotineiramente, mas também descobrem um leque de versões de possíveis futuros com base em seus resultados.

Celina Strzelecka, do Departamento de Etnologia e de Antropologia Cultural da Universidade de Wroclaw, afirma: “O passado, o presente e o futuro estão diretamente relacionados. Como as pessoas não são capazes de vivenciar o futuro, são forçadas a entender seu conceito com base nos outros conceitos de tempo: o presente (que é diretamente vivenciado) e o passado (que é conhecido por meio da memória)”.

Strzelecka chama o processo de estudar e pesquisar o futuro de Antropologia Antecipatória. O processo permite que pesquisadores que estudam o futuro descubram novas informações sobre ele por meio do desenvolvimento de diferentes histórias ou cenários alternativos para o futuro. Em seguida, avaliam o sistema social e cultural da história para entender como as pessoas irão reagir a essas possíveis situações futuras. Em outras palavras, é o ato de testar como as pessoas podem reagir a futuros eventos com base no que sabemos sobre pessoas e culturas atualmente.

Especular ou antever como as pessoas podem reagir a eventos, produtos ou serviços no futuro é um passo essencial para realizar pesquisas sobre o que está por vir. Isso nos ajuda a descobrir o que é possível ao afastar nosso pensamento do que está acontecendo agora ou o que ocorreu no passado. Também cria cenários para o futuro e especula sobre as novas possibilidades que cada um deles contém. Não se trata de descobrir fatos, mas sim de descobrir o que é possível. Na Echos, empregamos quatro modelos diferentes para realizar pesquisas sobre o futuro. Os processos abaixo exploram não só a forma de realizar essas pesquisas, mas também como fazer especulações de novas possibilidades para nossos futuros.

Falando sobre sonhos e desejos

Como você descobre os medos, sonhos e desejos das pessoas a respeito do futuro? O melhor processo é simplesmente perguntar para elas. Na Echos, realizamos pesquisas empáticas por meio de experiências conversacionais. Usamos estímulos para desenvolver a conversa. Podem ser imagens, perguntas ou frases que ajudem a mostrar seus pensamentos e sentimentos a respeito de seus sonhos para o futuro.

Por exemplo, uma ótima maneira de pensar nisso é mostrar uma série de perguntas impressas em cartões. Pode ser qualquer coisa, de frases ao estilo “preencha a lacuna” a perguntas que identifiquem sentimentos ou perguntas sobre o que gostariam de ver no futuro. O importante é que as perguntas sejam abertas e permitam que as pessoas compartilhem seus pensamentos e emoções sinceras.

Frases ao estilo “preencha as lacunas” funcionam bem. Um exemplo poderia ser: ‘No futuro eu gostaria de ver mais ________________ em minha cidade. A razão disso é _____________________. As conversas registradas por meio desse processo abrem as portas para sabermos o que as pessoas estão sentindo agora e como isso pode se relacionar a eventos futuros em sua cidade.

Observação social de quem está às margens

O próximo tipo de pesquisa é a observação social de quem está às margens da sociedade. Ela consiste em analisar pessoas que vivem fora da norma. Normalmente, elas vivem às margens das sociedades e estão abraçando novas tendências em suas formas de viver.

Essa análise pode ser feita de várias formas, por exemplo, avaliando postagens nas redes sociais, lendo notícias de locais periféricos específicos e identificando novas tendências tecnológicas emergentes. Isso também pode ser feito por meio da realização de entrevistas com especialistas que estão trabalhando em áreas ou tecnologias novas. A questão aqui é se lembrar de observar, ouvir e falar com pessoas que não estão vivendo um estilo de vida convencional.

Para um projeto em São Paulo sobre o futuro da vida urbana na cidade, a equipe da Echos visitou uma ocupação ilegal em que artistas e outros moradores periféricos viviam de forma compartilhada. Eles compartilharam suas visões, esperanças e medos sobre o futuro por meio de entrevistas. Por viverem às margens da sociedade convencional, suas visões eram muito diferentes. Isso é fundamental para pesquisas sobre o futuro, porque as periferias muitas vezes carregam tendências interessantes sobre o que poderia acontecer ou acontecerá futuramente. O segredo para encontrar esses sinais obscuros é olhar para onde ninguém está olhando. Isso significa que um pesquisador deve ser criativo e que a riqueza do que pode ser descoberto pode levar a novas maneiras de ver o futuro.

Identificação de sinais fracos por meio de tecnologias emergentes

Compreender o comportamento de pessoas que estão vivendo e usando tecnologias emergentes é importante, pois elas são pioneiras na adoção do que pode se popularizar. Novas tecnologias também estão ligadas a tendências econômicas que podem se tornar influentes no futuro. Uma vitrine que mostre como e por que as pessoas estão gastando dinheiro nessas novas tecnologias gera ideias sobre necessidades emergentes. À medida que investem em tecnologias de maneiras novas e interessantes, suas necessidades emergentes são expostas. Isso nos dá pistas de como as pessoas responderão a essas tendências se elas crescerem em importância no futuro.

Como pesquisadores, também é importante olharmos para os comportamentos humanos por trás das necessidades. Quais novas necessidades sociais são perceptíveis agora? Quais são as tecnologias emergentes usadas ou não usadas? Fazer essas perguntas ajuda pesquisadores a descobrirem novos padrões do comportamento humano. Conseguir identificar padrões recorrentes nos permite arriscar palpites, suposições e hipóteses; isso ajuda a desenvolver habilidades importantes de pensamento crítico e lógica sobre o que é possível no futuro.

Pode haver múltiplos padrões identificados; isso é bom porque permite que um pesquisador crie vários cenários ou histórias sobre o futuro com base nestes padrões. Um exemplo é observar o uso contínuo das bitcoins e como isso pode desestabilizar os atuais sistemas bancários. Existem dois extremos no comportamento das pessoas usam bitcoin. Alguns usam-nas para fazer compras e outros investem nelas para gerar rendimentos. Dentro desses dois comportamentos humanos, há semelhanças nos padrões. Ambos os grupos atribuem valor à bitcoin, assim como eles fariam com qualquer outra moeda. Ambos acreditam que ela tem valor em um ecossistema maior de marketplaces e comércio. Analisar a necessidade humana de novas moedas permite que um pesquisador se aprofunde mais em quaisquer padrões que eles possam identificar.

Intervenções futurísticas com provótipos

Uma intervenção futurística é uma investigação que usa objetos ou artefatos como representação de um futuro. Esses artefatos do futuro são chamados de provótipos. Um protótipo tradicional de design e um provótipo são muito semelhantes. A diferença é que, enquanto um protótipo é criado para testar um conceito de modo a se receber feedback, um provótipo tem como objetivo provocar discussões sobre o futuro.

Um provótipo deve ser apresentado como um objeto real do futuro. O objeto deve ser provocativo o suficiente para que gere discussões sobre as esperanças, sonhos e medos em relação ao futuro das pessoas que interagem com ele; pode ser tão sofisticado como um objeto de trabalho, como um drone, ou tão simples como uma história sobre o futuro em um cartaz na parede. O objetivo principal com esse processo é entender os sentimentos das pessoas em relação ao futuro. O que isso provoca nelas?

Usamos provótipos em nosso projeto para criar o futuro da vida urbana em São Paulo. Cobrimos as ruas com cartazes perguntando: ‘O que você pensa sobre o futuro da vida urbana?’ As pessoas começaram a interagir conosco com base nesses cartazes. Nossa equipe conseguiu entrevistar indivíduos e agendar follow-ups para se aprofundar em algumas de suas ideias. Um exemplo de um provótipo mais sofisticado é um curta-metragem mostrando uma versão detalhada de um cenário futuro. Desde que o processo faça com que as pessoas pensem em seus sentimentos sobre esse futuro prospectivo e depois falem deles, ele será uma ferramenta de pesquisa bem-sucedida. Pode ser qualquer coisa, desde que os leve a pensar e compartilhar.

Está pronto para especular sobre o futuro?

Pensar, especular e experimentar possíveis futuros não é uma tarefa simples, mas, ainda assim, não é impossível. O primeiro passo é encontrar o método certo de pesquisa. O segundo é encontrar as pessoas certas para testá-lo e, por último, começar a desenvolver novos cenários com base nos aprendizados.

Se abordarmos o futuro com a mente de um pesquisador, não há limites para o que podemos aprender e para as novas possibilidades que estarão disponíveis para nós. Saiba mais sobre nosso Design Futures Experience aqui.

Juliana Proserpio

Juliana Proserpio é empresária e educadora. Ela é a cofundadora e chefe de design da ECHOS, laboratório de inovação e suas unidades de negócios: Echos – Escola de Design Thinking – uma escola que coloca a inovação em prática, e Echos – projetos de inovação.
Nos últimos 10 anos, Juliana tem trabalhado para desenvolver um ecossistema de inovação na Austrália, Brasil e, recentemente, em Portugal para fomentar o poder do design para futuros desejáveis.
Ela tem mais de 10.000 horas trabalhando próximo aos clientes em design de facilitação, liderando uma ampla gama de projetos em setores como saúde, finanças, educação, varejo, notícias, tecnologia e bens de consumo.
Juliana fala sobre o poder do design para criar futuros desejáveis. Ela falou em eventos como o Global Innovation Summit em San Jose, Califórnia, TEDxMaua em São Paulo, Brasil, What Design Can Do e o Sydney Design Festival.