A história do planejamento de cenários futuros é curta quando comparada à quantidade de tempo que pode ser planejada por esse processo. A primeira pessoa que se tem registro de trabalhar com cenários futuros é Herman Kahn, que desenvolveu a prática de contar histórias futuras em seu trabalho com as Forças Armadas dos EUA e a RAND Corporation nos anos 1950.

Antes do trabalho de Kahn, o planejamento de futuros era feito a partir de um gráfico linear com apenas um resultado possível. Além disso, o processo não considerava pequenas tendências ou sinais que podem afetar o futuro, especialmente no campo dos movimentos sociais, que é bastante dinâmico.

Kahn continuou a desenvolver processos de cenários futuros para projeções de médio e longo prazos. E não apenas para um futuro, em uma linha de tempo; ele criava várias opções. Kahn, em associação com Anthony J. Wiener, escreveu ‘O ano 2000: uma estrutura para especulação sobre os próximos trinta e três anos’. Esse livro uniu os termos “cenário” e “prospectivo” pela primeira vez.

Anthony Wiener chamou o processo de “reduzir o papel da imprevidência” no âmbito das escolhas sociais. O objetivo era esclarecer o que seria um futuro melhor, e não criar profecias.

Kahn continuou a desenvolver maneiras de tornar o futuro mais claro com a ajuda de cientistas e pesquisadores, o que culminou na criação do ‘Método de Delphi’. O processo inclui consultas a diversos especialistas para chegar a uma opinião sobre o futuro. Os especialistas respondem a várias rodadas de questionários, e as respostas são coletadas e compartilhadas com o grupo após cada rodada. Contar com uma ampla gama de opiniões de especialistas é uma forma de minimizar os riscos de confiar em um único expert, o que poderia levar a respostas tendenciosas.

O método é especialmente útil quando não há uma resposta certa ou conhecida, como é o caso do planejamento de cenários a longo prazo. O processo é usado ainda hoje para ajudar a formular possíveis cenários futuros, e é um método fundamental empregado em nosso trabalho na Echos.

Embora os Estados Unidos tenham sido o primeiro país a focar no desenvolvimento de cenários para médio e longo prazos, foi um filósofo francês que iniciou essa nova maneira de pensar sobre futuros.

Gaston Berger usou o termo ‘prospectiva‘ como uma maneira de delinear a perspectiva de vários cenários possíveis de futuro. Analisar vários futuros prospectivos ou futuros prováveis foi uma maneira de ajudar a minimizar o risco de falhas no processo, uma vez que são criadas opções de cenários. Berger empregou esse processo de pensar sobre futuros prospectivos para ajudar na reconstrução da Europa no pós-guerra. Isso deu origem ao uso do planejamento de cenários futuros para problemas econômicos e sociais.

O Design de Futuros é especulativo

Na Echos, compreendemos o poder da imaginação. O design de futuros especulativos é um método para imaginar novos futuros possíveis. Não apenas um, mas um leque de cenários diferentes. Esses futuros são desenvolvidos para abordar grandes problemas sociais e/ou criar produtos e serviços para esses diferentes cenários.

Atualmente, as organizações, governos e empresas usam o método de cenários especulativos para definir várias visões dos futuros possíveis em curto, médio e longo prazos. Criar uma determinada quantidade de futuros prospectivos é um modo de explorar os múltiplos fatores e tendências que podem influenciar esses futuros e criar estratégias para minimizar o impacto de consequências inesperadas.

Estamos vivendo em um mundo que evolui rapidamente em várias frentes, como as mudanças climáticas, o desenvolvimento da pandemia e as polaridades políticas. É fundamental construir resultados sustentáveis que envolvem toda a sociedade para criar visões desejáveis e possíveis de novos futuros.

As etapas do planejamento de cenários

Assim como existem muitas versões diferentes de futuro, existem diferentes maneiras de criar cenários. Esses métodos compartilham as mesmas etapas, independentemente do nível de complexidade da organização, dos governos ou da linha do tempo desejada para chegar à nova visão do futuro.

Visão

O primeiro passo é a construção de uma visão para a entidade. Nesta fase, são realizadas entrevistas aprofundadas com decisores da organização para mapear a visão desejada. Eles são questionados sobre os fatores internos e externos que podem afetar direta e indiretamente essa visão de futuro.

Em uma empresa, as entrevistas devem ser realizadas com a diretoria ou com a gerência. Para projetos focados em determinada sociedade, as entrevistas devem ser realizadas com o governo ou com os próprios cidadãos. É importante entender as necessidades da organização ou da sociedade para criar uma visão que as inclua. Também é preciso mapear os fatores que podem ajudar ou dificultar a visão que está sendo criada.

Aprofundamento

O passo seguinte é mergulhar mais profundamente nos fatores que podem ajudar ou dificultar a concretização dessa visão de futuro. Os fatores que foram previamente mapeados nas sessões de entrevistas precisam ser explorados com mais profundidade, de modo a se entender todas as complexidades e desafios subjacentes.

Isso é feito por meio da participação de especialistas que têm profundo conhecimento sobre as possíveis vantagens e desvantagens de cada um dos fatores. Os especialistas nos assuntos em pauta participam de oficinas para identificar tendências que podem afetar os futuros da organização ou governo em médio e longo prazos.

É aqui que os sinais fracos entram em jogo. Prestar atenção a sinais fracos é uma das partes mais importantes do processo quando se trata de especular sobre o futuro. Os especialistas analisam as pré-tendências que estão surgindo às margens de determinada indústria. Quantas poderão se transformar em movimentos maiores? Essa análise ajudará as organizações a entender como proceder na etapa seguinte: o processo de criar um storytelling para cada cenário.

Consolidação

O terceiro passo foca em detalhar os componentes da visão estratégica com o desenvolvimento de cenários que trazem esse futuro à vida por meio de storytelling. Para criar esses cenários com base em storytelling, é importante simplificar as sessões para criar alinhamento e compreensão em toda a organização a respeito do que deve ser incluído nessas histórias.

Isso ajuda a ter acesso e entender o nível de comprometimento com a organização não apenas para sustentar as visões apresentadas nos cenários, mas também para garantir que as narrativas ressoem com os diversos públicos. Elas parecem autênticas? Elas ajudam a motivar as diferentes partes interessadas a buscar a visão de futuro em conjunto?

Monitoramento

O passo final é monitorar o sucesso dos cenários em curso. Devem ser estabelecidas diretrizes e indicadores de desempenho claros para monitorar a evolução da organização ao longo do tempo, à medida que ela busca alcançar o novo futuro.

Para as empresas, o uso de KPIs — Indicadores-chave de desempenho — e OKRs — Objetivos-chave e resultados — é o padrão para monitorar o sucesso de projetos em andamento. Ao trabalhar buscando novos futuros, é importante estar aberto para recalibrar objetivos ou metas à medida que o futuro se desdobra. Há muitos acontecimentos desconhecidos pela frente; é importante ser flexível e aberto para fazer ajustes ao longo do caminho e redefinir o conceito de sucesso.

Para monitorar o crescimento e a mudança ao nível social e governamental, iniciativas como os ODS — Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU — são um padrão internacional. São 17 metas que criam diretrizes para uma parceria global que desenvolva melhores futuros para o planeta. Essas metas estabelecem que o objetivo de acabar com a pobreza e outras carências deve andar lado a lado com estratégias que melhorem a saúde e a educação, reduzam a desigualdade e estimulem o crescimento econômico. Tudo isso enquanto lidam com as mudanças climáticas e trabalham para preservar nossos oceanos e florestas.

Além disso, a norma ISO 37101 desenvolvida pela organização ISO é um indicador que orienta e mede desempenho e qualidade de vida. A ISO é uma organização internacional independente e não governamental com a participação de 165 órgãos nacionais de normas. A ISO 37101 pode ser aplicada a qualquer cidade, município ou governo local que queira medir seu desempenho de maneira comparável e verificável, não importa qual seja seu tamanho e localização.

Independentemente do tamanho e do alcance do projeto e do nível de complexidade, qualquer cenário deve ser constantemente monitorado e atualizado com base em novos fatores ou sinais que não tenham sido identificados anteriormente. Todas as diretrizes acima funcionam como guias e devem ser ajustadas de acordo com a situação em que são aplicadas.

Criando cenários

É importante lembrar que cada organização ou sociedade é diferente e que não há regras rígidas e rápidas sobre o que seria considerada a abordagem correta. Ao criar cenários, não há nenhum número ideal para que as organizações comecem a concretizar suas novas visões de futuro.

Ao decidir sobre o número de cenários a serem criados, é importante considerar as tendências que impactam a visão da organização. Por exemplo, pode haver dois fatores que afetem o futuro de uma organização. Para ter mais informações sobre esses fatores, é preciso criar um cenário para cada um deles.

Dito isso, a criação de 2 a 4 cenários é o padrão da indústria. Mais do que isso pode levar a uma complexidade desnecessária e tornar o processo contraproducente.

Ao trabalhar com 4 cenários, por exemplo, eles são organizados em uma matriz de 4 quadrantes, um para cada cenário. Os eixos são os fatores que atuam como eventos desconhecidos que influenciam diretamente a organização. No caso de uma organização, os fatores podem estar diretamente relacionados ao seu desempenho, como o lucro ou o crescimento. Em um contexto governamental, podem ser as mudanças climáticas ou a economia.

Criando um novo futuro

Assim que os cenários forem desenvolvidos, o maior desafio é a implementação e o monitoramento constantes dentro da própria organização.

Como o grande artista e poeta Miró disse, “o amanhã ainda não existe” e, por essa razão, tudo pode mudar. Mesmo os cenários mais precisos e otimistas projetados em 2019 não previam um vírus que impactaria o mundo da maneira como aconteceu em 2020.

Além de construir cenários, as organizações devem focar em promover a resiliência e a adaptabilidade em seu plano atual de gerenciamento. Isso é fundamental para lidar com situações adversas e sobreviver ao longo do tempo, e requer o desenvolvimento de mecanismos para o monitoramento constante de tendências e fatores que surgem em nossos ambientes. O monitoramento adequado ajuda a reajustar os caminhos e a prosperar em um futuro incerto.

A chave para pensar e agir tendo o futuro em mente está relacionada à aquisição de novas competências. Entre em contato para saber mais sobre a nossa experiência de aprendizagem de Design de Futuros ou como podemos ajudar sua organização a desenhar seu próprio futuro.

André Arruda

André tem mais de 10 anos de experiência no desenvolvimento e gestão de soluções de design com foco em planejamento estratégico, atuando em diversos projetos na América Latina.
Especializado em design estratégico pelo Instituto Europeo di Design, mestre em Design e cenários prospectivos pela Universidade Federal de Pernambuco, tem como principal área de pesquisa futurologia e processos de design e inovação. Lidera equipes no desenvolvimento de projetos de inovação incremental e disruptiva para clientes como Google, Globo, Whirlpool, Fundação Bernard Van Leer, Banco Mundial, Ajinomoto, entre outros.
Desenvolve a facilitação de workshops usando técnicas mistas de design thinking e service design com processos voltados para o futuro para desenvolver cenários desejáveis de curto, médio e longo prazo para os clientes.