Para criar ou reinventar empreendimentos é preciso começar pelas necessidades do usuário
Tempos de crise costumam desafiar a resiliência humana, fazendo com que alternativas para o pior resultado sejam desenvolvidas. O momento em que vivemos com a pandemia do novo coronavírus não é diferente. O mundo ficou mais instável e, com isso, empresas, das menores às maiores, e seus respectivos donos e gerentes, precisam agora lidar com a complexidade de um mercado que está mudando a toda hora, cada dia mais rápido.
Em nosso atual momento, em meio à essa pandemia global, o comportamento humano, que já está em rápida transformação, é ainda mais impactado, uma vez que temos uma mudança estrutural na forma como interagimos, trabalhamos e consumimos. As medidas de restrição criadas para evitar a propagação da doença criaram novas situações e ambientes – na verdade, reduziram todos os espaços de contato interpessoal ao nosso lar.
Como podemos, então, lidar com tais mudanças radicais e entender esses novos comportamentos? Como estimular o surgimento de novas ideias para criar e entregar um serviço ou um produto que responda às necessidades do cliente, estruturando e executando protótipos de forma rápida e assertiva?
A ideia deste texto surge, portanto, com o intuito de apresentar caminhos para que empreendedores, chefes de empresas e até mesmo empregados possam contornar problemas desta crise, seja dentro de seus próprios negócios ou por meio da criação de produtos e serviços. Para isso, vamos explorar um pouco dos recursos do Business Design.
Planos de negócio tradicionais X Business Model Canvas
Um planejamento se baseia em premissas, que devemos assumir como verdadeiras para que o plano se concretize. Embora uma nova ideia de negócio seja vista como um conjunto de hipóteses que são entendidas, à priori, como certas, é preciso que elas sejam validadas – isto é, testadas a partir de conversas e experimentos com o público, usuário ou consumidor. Essa forma de testar e experimentar é o que chamamos de modelagem de negócio, um formato adotado cada vez mais por empreendedores e startups no lugar dos tradicionais longos planos de negócios, cheios de planilhas extensas, com previsões financeiras de longo prazo e, às vezes, até impraticáveis.
Pensando nessa mudança de paradigma, de modelos sustentados em hipóteses em vez de um plano baseado em crenças, Alexander Osterwalder criou, a partir da abordagem do Design Thinking, o Business Model Canvas. A proposta de Osterwalder foi criar uma ferramenta para que empreendedores e inovadores pudessem trabalhar novas ideias de negócio ou então melhorar o desempenho de estratégias existentes.
O Business Model Canvas é uma ferramenta visual para que um empreendedor ou os times multidisciplinares possam, de forma colaborativa, colocar as suas hipóteses em categorias. Ao final, nove de todas as sugestões feitas deverão ser levadas em consideração no processo de elaboração de uma nova ideia.
O nosso ponto de partida será essa ferramenta por sua natureza dinâmica e visual. Esse recurso nos permite entender melhor para quem estamos criando valor (quem é o nosso foco) e como trabalhar a cadeia que vai justificar a relevância desse negócio. Assim, damos início ao processo de inovação.
Os nove blocos de um modelo de negócio: trabalhando as hipóteses
O Business Model Canvas é estruturado em nove blocos principais que buscam abranger os principais aspectos da criação de um novo empreendimento. Se o empreendedor explorar todos esses possíveis caminhos que o modelo Canvas lhe oferece para o desenvolvimento de novos negócios, ele estará mais apto e preparado para executar algo inovador.
Então, vamos entender os nove blocos:
- Segmento de clientes
- Proposta de valor
- Canais
- Relacionamento com os clientes
- Fontes de receita
- Recursos chave
- Atividades chave
- Parceiros chave
- Estrutura de custo
Essa divisão, proposta pelo modelo, foi criada para exercitar o pensamento criativo, incentivando o empreendedor a buscar soluções que fogem do lugar comum. Esse caminho é que vai permitir o “pensar fora da caixinha”. Essa técnica vai fertilizar o terreno das ideias e ajudar a criatividade a submergir do mar de propostas óbvias que muitos negócios estão buscando neste momento de crise.
Ao utilizar o Business Model Canvas, exploramos primeiro os blocos de proposta de valor e segmento de clientes que trabalham justamente a desejabilidade de um negócio: se o que estamos propondo endereça, de fato, uma necessidade real e latente de alguém.
Em seguida, buscamos entender como esses blocos se conectam, isto é, de que forma a entrega de valor vai ocorrer, desenvolvendo o relacionamento com os clientes e os canais de distribuição e também de comunicação com o cliente.
Após esse passo, é preciso refletir se o que estamos pensando é tecnicamente executável, explorando os blocos atividades, recursos e parceiros chaves. Precisamos depois formular uma estrutura financeira viável (uma projeção de gastos e lucros) e como cobrar do cliente. Vale reforçar: para contemplar essas três etapas é preciso iniciar o processo pensando exclusivamente no usuário. Esse processo é chamado de problem solution fit.
Segmento de Clientes
A rotina do planeta foi alterada por conta do novo coronavírus. Esse momento de alta instabilidade fez e ainda faz com que as pessoas em diferentes países tenham de mudar radicalmente suas relações de consumo. Isso está impactando o seu negócio? Se sim, busque entender as novas necessidades que surgiram e ainda podem surgir a partir dessas mudanças de hábitos. O que é mais valioso para as pessoas nesse novo contexto?
O ‘segmento de clientes’ se refere justamente à forma como vamos definir o usuário ou grupos de pessoas que pretendemos atingir e para quem queremos gerar valor. O foco aqui não é tanto em traçar um perfil demográfico mas sim em entender o comportamento deste usuário. O conhecimento profundo desse nosso usuário é fundamental na criação de um negócio centrado no usuário, por isso, é importante realizar conversas, pesquisas e se aprofundar nesse perfil,entendendo quais são suas principais necessidades.
Proposta de Valor – desenvolvendo inovação em modelo de negócio
Nesse contexto de crise o que é realmente importante para as pessoas? Que valor queremos criar para elas para endereçar esses novos problemas? Essas são as perguntas que norteiam as hipóteses de valor dos produtos e serviços que queremos criar agora. Alguns tipos de proposta de valor:
– novidade: um conjunto completamente novo de necessidades, que os clientes anteriormente sequer percebiam ter, dada a carência de ofertas similares. A HelloFresh é uma startup alemã que focou em resolver um problema do cliente: oferecer tudo que ele precisa para preparar uma refeição. Esse novo serviço está experimentando um crescimento exponencial justamente por atender a uma necessidade latente desse novo consumidor confinado, de uma nova forma. As ações da empresa estavam cotadas a 19 euros no dia 16 de março, quando a crise do coronavírus não tinha forçado grande parte dos países a adotar quarentenas. Quase um mês depois, em 15 de abril, o valor dos papéis chega a 29 euros.
– desempenho: melhorar o desempenho de produtos e serviços existentes. Vários produtos geram insatisfação dos seus usuários. Muitas pessoas se sentem descontentes com o atendimento prestado pelos seus bancos, que costumam cobrar taxas com valores bem altos. O Nubank buscou redesenhar a forma como as pessoas lidavam com serviços bancários e hoje já é um unicórnio. Da mesma forma o QuintoAndar buscou melhorar o processo de aluguel de moradia. Será que na crise, descontentamentos que até então estavam latentes irão dar as caras?
Vejamos uma situação que aconteceu recentemente: parte da população brasileira estava enfrentando dificuldades para receber o auxílio emergencial disponibilizado pelo governo. Isso porque o serviço, criado em cima da hora, estava desorganizado e não foi pensado para esse público/usuário (para receber o valor, o cidadão precisa se cadastrar em um site ou app, o que desconsidera a falta de familiaridade de várias pessoas com tal tecnologia, aumentando a probabilidade de fraudes e golpes). Talvez um serviço que ensine o funcionamento desses recursos ou que crie um ranking de apps confiáveis pudesse ganhar a atenção do público e evitar esse tipo de problema.
– personalização: o foco desta proposta é atender a necessidades específicas dos clientes de forma individual. Um exemplo: com limitações de circulação, as pessoas estão fazendo exercícios físicos em casa por meio de vídeo aulas disponibilizadas pelas academias. Mas há quem se interesse por exercícios voltados para fortalecer os braços, outros preferem exercitar as pernas e também têm aqueles que querem apenas ter flexibilidade. E nem sempre o que as pessoas buscam exatamente está disponível na internet ou atende as suas expectativas de forma ampla. Por isso, pessoas que não se sentem motivadas a se exercitar com essas aulas estão contratando personal trainers para montar exercícios mais personalizados. Há também quem faça aulas por videoconferência, permitindo uma interação que as aulas pré gravadas não possibilitam.
– preço: Alguns serviços quando estavam impossibilitados de funcionar, por conta do isolamento social, como salões de beleza e estúdios de tatuagem, venderam vouchers para tratamentos estéticos e tatuagens para serem usados quando reabrissem. Por um preço mais barato do que o normal, eles conseguiram antecipar alguma receita para manter as contas em dia, e os consumidores conseguiram economizar. O voucher do bem reuniu algumas empresas que adotaram essa estratégia nesse site.
– acessibilidade: possibilitar que um público amplo tenha acesso aos produtos e aos serviços. Pense, por exemplo, na praticidade que aplicativos como o Rappi proporcionam, ao disponibilizar o sistema de delivery para diferentes estabelecimentos, sejam grandes ou pequenos. Com restrições impostas pelo isolamento social, todos os aplicativos de entrega tiveram aumento na demanda, e restaurantes que antes não faziam entregas começaram a oferecer entrega em domicílio a seus clientes.
– conveniência: produtos e serviços que podem ser flexibilizados de acordo com o interesse e a disponibilidade do cliente. Pense por um instante nas lojas de conveniência de um posto de combustível. Por que elas são chamadas assim? Em geral, elas ficam abertas 24 horas, portanto o cliente pode frequentá-las em qualquer horário. Essa proposta trata sobre isso. São maneiras de atendimento que se flexibilizam de acordo com o interesse ou vontade do cliente/usuário. O sistema Doutor Consulta é um exemplo. Esse serviço permite que pessoas sem plano de saúde marquem, de forma rápida e prática, exames e consultas médicas pelo site ou aplicativo. Recentemente a empresa lançou um recurso de telemedicina, que após anos de resistência foi liberado pelo governo, que ajudar pessoas com dificuldades de locomoção ou no grupo de risco – inclusive depois da pandemia.
O novo coronavírus afetou drasticamente a forma como nós nos relacionamos em nosso cotidiano e essas mudanças deverão perdurar por algum tempo. Muitos negócios precisarão ser revistos e, talvez, suas estratégias reinventadas para não irem à falência. Mas, antes de que aquele desespero bata, vamos lembrar que há quem esteja disposto a ajudar empreendedores a encontrar um caminho para contornar essa situação.
Entender as novas demandas do novo mundo que estamos vivendo é fundamental e o design de negócio é um facilitador para promover essas experimentações centradas no usuário. Quer começar a implementar o Business Design no seu negócio? Baixe o nosso modelo do Business Model Canvas e confira alguns materiais que preparamos para você no site! Eles vão te auxiliar nesse processo.
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