Em um contexto de transformações profundas nos modelos da nossa sociedade, sejam eles de toda sorte, tecnológico, econômico, social, educacional e político, os negócios, ou pelo menos, a forma de empreender, precisa também se reinventar.

Afinal, assim como nós, Homo sapiens sapiens, evoluímos até aqui, as empresas estão procurando sua nova versão, “Negotium sapiens”, para sobreviver nessa nova “natureza dos negócios”.

Porém, o que poucos compreendem é que a contemporaneidade exige mais do que uma adaptação puramente tecnológica. Empresas que querem permanecer vivas no futuro precisam estar preparadas a lidar com incertezas e ambiguidades e prontas para inovar.

O que é preciso para sobreviver em um contexto cada vez mais desafiador?

Recentemente, em uma conversa com uma cliente surgiu esse tipo questionamento. Questionamento esse comum para muitos outros clientes – ainda que não expressado de modo explícito – e que, ao fundo, revela uma grande dor para empresas e líderes.

Acredito que a chave para empresas do futuro seja exatamente desenvolver e cultivar a habilidade de navegar e lidar com esse mundo V.U.C.A. – volátil, incerto, complexo e ambíguo. O futuro exigirá das empresas a habilidade de estar preparada para constante mutação.

A invenção da cultura e a sobrevivência do mais apto

Como já pontuou Charles Darwin, não foram as espécies mais fortes ou maiores que conseguiram permanecer vivas ao longo dos milênios, mas aquelas capazes de fácil e inteligentemente se adaptar às mudanças.

Na ciência da evolução, já é aceita a teoria de que várias espécies Homo foram contemporâneas. A Sapiens e Neandertal são exemplos. Por isso, a ciência já refuta a visão linear de evolução. A ideia que uma espécie vem depois da outra não existe. Mas sim que elas convivem. A sobrevivência e, consequentemente a evolução,  acontece para aquela com a melhor capacidade de aprender.

Vale dizer também que a revolução cognitiva do ser humano deu-se há aproximadamente 70 mil anos, quando “inventamos” a cultura e a partir daí surgiu a história humana. E a história mostra que uma cultura melhor adaptada, flexível e coesa, sempre se impõe sobre a outra, mais frágil, mesmo que seus indivíduos sejam mais fortes fisicamente. Hoje estamos aqui e os neandertais não.

Sob essa lógica, empresas do futuro surgem como novas espécies – sob esse movimento que chamamos de startups. No entanto, as empresas atuais também poderão evoluir, mas deverão possuir e desenvolver a inteligência organizacional necessária para se adaptarem a um contexto, como dito, cada vez mais complexo.

Porém, o grande equívoco de empresas e líderes é acreditar que essa habilidade é adquirida simplesmente por treinamentos ou em oferecer uma bela sala de convivência.

Facebook, Google, Uber e outras empresas que mais se destacam e crescem de forma exponencial nesse novo contexto de mundo, não o fazem porque oferecem (apenas) um ambiente bem decorado ou treinamento constantes, mas sim, porque a liderança entende a importância das forças consideradas invisíveis que ditam a forma como as pessoas e a organização como um todo consegue entregar – ou não – valor.

A essa forças chamamos de cultura.

A cultura – seus valores, normas, mensagens inconscientes e comportamentos sutis de seus líderes e colaboradores – é o principal componente para uma organização se manter viva e inovadora.

Estamos falamos, portanto, da cultura como uma habilidade adaptativa por assim dizer. Habilidade essa que provém de um ambiente organizacional propício e pessoas engajadas capazes para constantemente pensar e gerar inovação.

O ponto é que negócios no futuro serão bem sucedidos se souberem lidar com os fatores invisíveis, tudo aquilo que não podemos tocar, mas que impacta diretamente na forma como agimos.

Nesse sentido, o sucesso organizacional estará atrelado a construção de uma cultura voltada para a inovação.

Inovação da cultura: o fator criatividade

Em sendo a cultura um elemento intangível, e também uma invenção humana, uma manifestação da criatividade da nossa espécie, nós, seres humanos, somos os arquitetos daquilo que desejamos nos tornar.

Do mesmo modo, é possível redesenhar a cultura de uma organização. Valendo-se disso, líderes experientes moldam a cultura de suas respectivas organizações para que sirvam de catalisadores de inovação.

Contudo, muitas organizações não se dão conta do quanto a sua constituição original, seu propósito, seu DNA são blindados, fechados à “evolução da própria espécie”.

Gostaria de citar um exemplo simples, mas que mostra se uma empresa está construindo (ou não) uma cultura voltada para inovação.  Chamo de “catraca para dentro”. Em diversas organizações, vemos naturalmente que o nome do colaborador – e portanto sua identidade – está intimamente relacionada à área em que atua. Assim, o colaborador se torna o fulano do marketing ou ciclano do jurídico.

Pode parecer um hábito simples, mas no campo invisível o indivíduo acaba se tornando aquilo que ele faz. Como consequência a experiência de vida pessoal dos funcionários é castrada. Não se valoriza aquilo que ele é além do ambiente profissional e ele próprio acaba se “esquecendo” disso.

Um exemplo? O fato da companhia pouco explorar que o “Fulano do Marketing” é, lá fora, também o baterista de uma banda de rock.

Seria interessante estimular a visão de um baterista na resolução dos desafios cotidianos da empresa. São essas conexões não-óbvias que levam as organizações a novos caminhos, as permitem estar em constante adaptação e evolução e que, ao cabo, contribuem na criação de uma cultura de inovação.

Quero chamar a atenção para o fato de que quando enxergamos as pessoas como elemento central da cultura organizacional, estamos ativando o recurso mais importante na evolução de uma organização: o fator humano.

Assim, reforço que para que uma empresa se mantenha viva e inovadora e, portanto, evolua, é preciso desenvolver uma cultura de inovação.

É um exercício de autoconhecimento, uma visão de transformação que tem que acontecer de dentro para fora. É a sutil diferença entre o que a manterá viva e próspera ou a colocará como referência histórica de passado. Para tanto, acredito em algumas premissas básicas:

_criar espaço para explorar. Se você não oferece ambiente para que as pessoas possam explorar idéias, experimentar conceitos e testá-los, nada mais fará sentido;

_Tolerância ao erro. Esse mundo que emerge complexo, não comporta a linearidade das soluções.Estamos falando de inovação. Os projetos passam não se basear em respostas certas, mas em um constante processo de erro e acerto. Essa passa a ser a regra do jogo;

_Espírito de participação. Estimule a participação das pessoas em desafios além de suas áreas de atuação. O futuro é trabalhar por projetos, atividades, de acordo com o desafio que se apresenta. Pontos de vista diferentes são importantes;

_Reconhecer esforços. O processo de inovação não é linear e não possui respostas certas e erradas. Muitas vezes um projeto se mostrará inviável e suas soluções não serão levadas adiante. Isso não significa falha ou fracasso, mas sim parte do processo de aprendizado;

_construir uma linguagem comum do que é inovação. Partindo da aquisição de vocabulário (como por exemplo Design Thinking) até o alinhamento do que significa inovação para toda a empresa.

A partir dessa visão, qualquer negócio será capaz de tatear, pelo menos, uma nova forma de agir e lidar com esse contexto dinâmico e complexo.

Se a evolução é um fator inerente à nossa condição humana e naturalmente dos negócios, a cultura tem uma função vital nesse processo.

Acredito que organizações que estejam dispostas a incorporar e praticar as premissas de uma cultura de inovação, aumentarão suas chances de sobrevivência, tornando-se adaptadas às transformações que estamos presenciando e ainda mais relevantes para as pessoas as quais atendem.

Afinal, como já disse o filósofo contemporâneo Mario Sergio Cortella: “Mudar é complicado, acomodar é perecer”.

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É empreendedora e educadora. Ela é cofundadora da ECHOS e suas unidades de negócios: Design Echos e Escola Design Thinking.

Ao longo dos últimos anos, Juliana tem trabalhado para desenvolver um ecossistema de inovação no Brasil. Atua como líder em projetos de inovação nas áreas de saúde, construção, internet das coisas e outros. Como educadora, dissemina o conceito de inovação para o bem.

Em 2014 palestrou no Global Innovation Summit, em San José, Califórnia e, em 2015 foi jurada do primeiro prêmio William Drentel de design para impacto social e foi convidada a palestrar no TEDx Mauá.