A América Latina é classificada pelo Índice Global de Inovação como “uma região com potencial para inovação inexplorado [mas] com importantes riscos a serem trabalhados no curto prazo”. Um elemento crucial para evitar tais riscos e atingir esse potencial reside na capacidade e competência para fomentar políticas públicas de inovação nos sistemas de inovação presentes nos países e regiões latino-americanos.

Parte dessa questão está simplesmente em entender a atual dinâmica do sistema de inovação. Por exemplo, quais áreas de conhecimento e habilidades são abordadas quando se tem um desafio de inovação? Como (e se) as partes do sistema trabalham juntas? Quais competências e expertises estão sendo desenvolvidas para conseguir alcançar os objetivos e por que?

Para responder a esses questionamentos, faz-se necessário uma ampla e profunda análise tanto de cada instituição que desenvolve e entrega políticas de inovação, quanto em relação às formas pelas quais essas instituições interagem entre si para criar um (efetivo) sistema voltado para inovação.

A Nesta, recentemente, liderou um estudo pioneiro o qual analisava as agências de inovação, examinando seus papéis, estratégias e desenvolvimento – que em breve receberá contribuições do Banco Mundial e do Banco Interamericano de Desenvolvimento.

Esse trabalho pode ser complementado pelas avaliações feitas sobre como cada agência contribui para capacitar o sistema – em 2015, a Nesta observou as estruturas dos sistemas públicos dos países da Aliança do Pacífico: México, Chile, Peru e Colômbia. Muitos desses países estão tentando ativamente coordenar as ações de suas instituições públicas por meio de “comitês coordenadores” ou comissões mistas ministeriais com o objetivo de ajudar a construir pontes para as tradicionais divisões entre, digamos, as estratégias das agências de fomento e as agências de suporte a empreendedores, considerando os mais variados níveis de sucesso.

Assim, a pergunta que fica é: como os países latino-americanos podem evoluir o entendimento ainda embrionário sobre seus sistemas de inovação para que consigam melhor desenvolver suas competências em criar políticas de inovação e sejam capazes de competir e triunfar no século 21? Eis 5 recomendações:

  1. Pense grande – almeje atingir desafios globais

 

Muitas das instituições latino-americanas que compõem os sistemas de inovação estão focadas principalmente no desenvolvimento de negócios como caminho para acelerar a economia. Embora o contexto dos problemas da América Latina sejam tradicionalmente uma combinação mais intrínseca de aspectos sociais e econômicos – pelo menos se comparado aos países desenvolvidos – as principais estratégias das agências mais relevantes voltadas à inovação tendem a focar no setor privado, em grupos econômicos ou no desenvolvimento de negócios.

O excelente trabalho de Johan Schot e outros na SPRU (Science Policy Research Unit da Universidade de Sussex) sugere que os países da América Latina e outros precisam posicionar suas políticas de inovação como um veículo para abordar desafios sociais e econômicos mais abrangentes.

Conforme afirma o Professor Schot, o futuro das políticas de inovação deve estabelecer objetivos mais ambiciosos, focados “em mobilizar o poder da inovação para resolver uma ampla quantidade de problemas da sociedade incluindo desigualdade, desemprego e mudança climática”.

  1. Engajamento por todo o ecossistema

Sugerir que os governos latino-americanos não consultem ou trabalhem com grupos externos – universidades, representantes do setor privados, etc – quando planejam suas políticas de inovação seria uma simplificação excessiva. No entanto, muitas de suas políticas são iniciadas pelo governo e, em boa parte dos casos, o desenvolvimento e a aplicação de políticas acontece por meio de ministérios e agências do setor público, particularmente quando legislações mais modernas exigem esse papel de execução por parte do governo.

Políticas de inovação, entretanto, cada vez mais são formuladas e entregues pela intensa colaboração de diferentes partes do ecossistema de inovação, em todos os estágios de desenvolvimento.

A pioneira iniciativa de desenvolvimento proposta pelo MIT, o “Programa Regional de Aceleração de Empreendedores” está deliberadamente estruturado para exigir que agências do governo, gerentes de programas de empreendedorismo universitário, profissionais do setor privado que promovem inovação e representantes setoriais e das indústrias trabalhem juntos em projetos compartilhados de risco e recompensa para desenvolver seus sistemas de inovação.

Esses tipos de programas oferecem um modelo que incentiva a criação pelo ecossistema de políticas para inovação mais colaborativas.

  1. Use as evidências e dados mais efetivos (ainda que não sejam os mais robustos)

A qualidade dos dados econômicos “clássicos” para a elaboração de políticas de inovação em toda a América Latina pode ser descrita como indeterminados. Mesmo no Reino Unido, há contundentes críticas sobre as medidas e indicadores oriundos da economia tradicional quando aplicados a setores, práticas e indústrias inovadoras; críticas essas que basicamente recaem sobre o fato dos indicadores não conseguirem acompanhar o ritmo das mudanças, não descrevem a realidade e que não podem ser facilmente aplicados às complexas organizações prestadoras de serviços.

Abordagens mais recentes sobre pesquisa, compilação e análise de dados para as políticas de inovação serão cruciais no futuro tanto para países desenvolvidos quanto países em desenvolvimento.

O trabalho da Nesta com o governo galês em “Arloesiadur”, um painel com novos tipos de dados compilados para as políticas de inovação, caminha para uma potencial solução. Por exemplo, tradicionalmente  a previsão das habilidades profissionais é feita periodicamente por meio de modelos de pesquisa econômica. Porém, ao vasculhar sites online de oferta de emprego de uma cidade ou região e usar máquinas que aprendem para processar os dados é possível obter atualizações constantes sobre como, por exemplo, a habilidade em linguagem em programação é exigida para diferentes empregos em diferentes locais ou setores.

Esse tipo de uso de dado pode ser particularmente poderoso para a América Latina e para outras economias emergentes, onde as fontes tradicionais de dados são menos confiáveis do que a dos países desenvolvidos, permitindo “tapar o buraco” da falta de informação sem depender de extensos e caros estudos para aumentar a qualidade dos dados adotados pela economia tradicional.

  1. Ser capaz de avaliar melhor o que funciona

Essa capacidade também será fundamental no futuro para economias emergentes e desenvolvidas: uma enorme quantidade de políticas e estratégias de inovação sem que tenha robusta prova de que funcionam. Países latino-americanos deveriam se juntar ao crescente movimento global o qual exige uma avaliação mais séria das iniciativas relacionadas às políticas de inovação, por uma variedade de razões, até sobre e incluindo abordagens de controle de testes randômicas.

Saber lidar de forma mais assertiva com quais iniciativas são “as diferenças que fazem a diferença’ em um dado contexto de um país será um passo crucial em aumentar a efetividade do sistema de inovação.

O Laboratório de Fomento à Inovação da Nesta oferece um fórum e o conhecimento sobre como melhorar a qualidade das avaliações das políticas de inovação e representa um repositório “do que funciona” nessa área.

  1. Use a colaboração internacional para acelerar a capacidade de promover desenvolvimento

O Índice Global de Inovação de 2016 também pontua: “muito do potencial de colaboração para inovação é subaproveitado no nível regional – dentro da África, da Ásia, América Latina e outras regiões”.

A maioria das agências de inovação governamentais têm orgulho de considerar suas contrapartes, especialmente, de países vizinhos como rivais ao invés de potenciais colaboradores. Além disso, a maioria dos objetivos de inovação de um país não deveriam representar um jogo de soma nula: ao descobrir o que funciona e aprendendo sobre novas abordagens, técnicas e estratégias em políticas de inovação, a colaboração entre agências e nações será provavelmente muito benéfica.

Grupos regionais na América Latina, como o Mercosul e a Aliança do Pacífico, possuem grandes possibilidades para uma efetiva colaboração em criar políticas de inovação.

Em 2016/2017, o Programa Global de Aceleração de Políticas Públicas da Nesta tem oferecido aos articuladores de políticas públicas de países da Aliança do Pacífico o suporte e a oportunidade para que compartilhem experiências, conhecimentos e como criar uma agenda compartilhada. Ao final, oferece um futuro modelo de trabalho para desenvolver políticas públicas baseado em colaboração regional.

Esta é uma versão resumida da palestra realizada no Fórum Latino Americano da Universidade de Edinburgh, ocorrida em 15 de fevereiro de 2017. Fica aqui registrado o agredecimento da Nesta à equipe do Fórum e a sua Vice Presidente Carolina Isenberg pelo convite.


Artigo publicado pela Nesta em 16 de fevereiro de 2017. Para acessar o conteúdo original em inglês, acesse aqui.

Ricardo Ruffo

Ricardo Ruffo is a born entrepreneur, educator, speaker and explorer. As a writer by passion Ricardo daydreams on how the world is changing fast and how it could be.

Ruffo is the founder and global CEO of Echos, an independent innovation lab driven by design and its business units: School of Design Thinking, helping to shape the next generation of innovators in 3 countries, Echos – Innovation Projects and Echos – Ventures. As an entrepreneur, he has impacted more than 35.000 students worldwide and led innovation projects for Google, Abbott, Faber-Castell and many more.

Specialist in innovation and design thinking, with extensions in renowned schools like MIT and Berkeley in the United States. Also expert in Social Innovation at the School of Visual Arts and Design Thinking at HPI – dSchool, in Germany.

Naturally curious, love gets ideas flying off the paper. He always tries to see things from different angles to enact better futures. In his free time, spend exploring uninhabited places around the world surfing.