Fairlight, Sydney – 12.05.2016

É incrível, não apenas estar de volta à Austrália – lugar que chamei de casa em 2008 – como ver o quanto o país se transformou e evoluiu desde então.

Em 8 anos, a nação australiana, com os seus 23 milhões de habitantes, realmente mudou. O que me fez questionar: Por que outros sistemas menores não conseguiram alcançar essa mudança?

Surpreendentemente dessa mudança toda, o que mais tem se transformado e renovado é a COMIDA.

A comida na Austrália é tão inovadora de um modo que nunca vi antes. Com a fusão asiática, a comida atinge um significado totalmente diferente aqui.  O que se come na Austrália tem se tornado cada vez mais saboroso, inovador e vanguardista. Fusões, comida crua, orgânicos, entre outros. Australianos e estrangeiros em conjunto estão experimentando tudo e essa experimentação está valendo a pena. A comida é deliciosa e autêntica e acredito que um novo tipo de cozinha está surgindo aqui.

Estou maravilhada em poder experimentar e comer em primeira mão esse novo tipo de culinária!

É a possibilidade de assistir à inovação acontecer diante de mim em escala e de baixo para cima. E preciso dizer: não há ninguém mandando os australianos: “precisamos reinventar a gastronomia do país!”.

Para te mostrar essa realidade, separei 3 razões do porquê, em minha opinião, está acontecendo uma revolução na cozinha australiana:

1. A crescente diversidade

Austrália é um país com uma população em crescimento. O Censo de 2011 relatou que 1 em cada 4 dos quase 23 milhões de habitantes nasceram no estrangeiro, sendo que boa parte desses imigrantes são asiáticos. É encontro surpreendente entre o Leste e o Oeste acontecendo agora enquanto você lê este artigo.

Apesar desse fluxo migratório ainda ser uma questão polêmica no país, o fato é que ele está acontecendo e têm ativado a criatividade e inovação em um nível nunca antes visto.

2. Amor à comida como parte da cultura

Os australianos amam assistir, falar e, é claro, comer boa comida. Lembro-me de achar engraçado como ser possível que quase todos os canais de TV pudessem transmitir, ao mesmo tempo, programas culinários. Também me lembro que lá em 2008 os pratos de destaque ainda eram a comida “tradicional” australiana: camarão grelhado (“Shrimp on the Barbie”), generosos filés (“steaks”), tortas de carne (“meat pies”) e, é claro, batatas e peixe fritos (“fish and chips”). Que diferença hoje em dia!

Fica claro que os australianos são amantes da comida e a cultura gastronômica é enorme; está embebida nas suas vidas.

3. Cultura boêmia

Embora Melbourne e Sidney já possuam uma cena importante de restaurantes e bares, ela continua a crescer cada vez mais. Australianos tem enraizado o hábito de comer fora de casa. Muito porque esses momentos servem não apenas para compartilhar uma boa comida como também para dividir experiências e histórias com amigos e familiares. Esse hábito está intimamente conectado ao que se chama aqui de “land of content” ou numa tradução livre, terra do contentamento. O que significa dizer que a Austrália e os australianos são muito ligados a um estilo que reflita qualidade de vida e esse é um fator muito importante na vida deles.

Acredito que esses três fatores quando combinados permitiram a emergência desse maravilhoso cenário gastronômico de fusões asiáticas e outros tipos de cozinhas e a um nível de experimentação com a comida nunca antes visto.

 

Ao mesmo tempo, essa história me traz algumas lições sobre como podemos fazer a inovação florescer em grandes e complexos ecossistemas e como podemos transpor a inovação para qualquer contexto e em qualquer escala. Aproveito para compartilhar os 3 maiores aprendizados para que sejamos capazes de gerar inovação em um ecossistema:

1. Diversidade importa

Novas ideias emergem a partir de novas conexões. Nada novo vai sair de velhos hábitos ou de um velho jeito de fazer as coisas. Por isso que se relacionar com pessoas diferentes de você oferece um enorme potencial de inovação muito maior do que apenas se conectar aos seus colegas, que provavelmente pensarão de modo semelhante.

Quando se tem diferentes grupos, culturas e modos de pensar se encontrando, a princípio pode acontecer um conflito. Porém, se nos permitirmos misturar as ideias ao invés de rebatê-las, podemos fazer um ótimo e saboroso caldo. Grandes ideias são como os temperos asiáticos: quando combinados eles apresentam um inesperado – e potente – sabor que nos faz amar a comida asiática logo de cara.

A Austrália também possui uma intensa mistura de etnias acontecendo neste momento. 1 a cada 4 cidadão australiano não nasceu na Austrália. A localização geográfica do país faz com que esteja bem ao lado do continente asiático e das ilhas do pacífico, característica que nenhum outro pais ocidental possui.

2. A inovação vem da autenticidade

Vale dizer que essa cultura da boa comida já estava ali na Austrália, não foi imposta. Assim, já era algo compartilhado entre as pessoas do ecossistema, o que forneceu a autenticidade e a força necessárias para que a inovação surgisse.

3. O ecossistema precisa estar preparado ou pré-existir

Essa nova cozinha não emergiria se ali não houvessem um cenário gastronômico, com bares e restaurantes, bem como com chefs de cozinha, souschefs, bartenders e garçons experientes e educados. O ecossistema estava preparado para receber essa inovação e os clientes também estavam buscando algo novo. Todos estavam abertos e curiosos para a novidade. Esse ambiente deu aos chefs e criativos a confiança necessária para buscarem o caminho de inovação. Por fim, a Austrália é uma economia pulsante com dinheiro circulando em abundância e com pessoas dispostas a investir em diferentes experimentos.

Se pegarmos a literatura sobre inovação veremos que a inovação na comida na Austrália surgiu do que chamamos de 3 princípios da abundância (diversidade, amor/cultura da comida e um ecossistema pré-existente e vivo).  Entretanto, inovação também pode surgir em diferentes contextos, incluindo o de escassez. Se você quiser saber como, não deixe de nos acompanhar. Falarei sobre isso nos meus próximos artigos aqui no blog.

E se você ficou curioso – e faminto – com as fotos desses deliciosos pratos, saiba que elas foram tiradas por minha amiga e amante da boa comida Marina Paronetto (@marinaparonetto) em Melbourne ;).

Juliana Proserpio

Juliana Proserpio é empresária e educadora. Ela é a cofundadora e chefe de design da ECHOS, laboratório de inovação e suas unidades de negócios: Echos – Escola de Design Thinking – uma escola que coloca a inovação em prática, e Echos – projetos de inovação.
Nos últimos 10 anos, Juliana tem trabalhado para desenvolver um ecossistema de inovação na Austrália, Brasil e, recentemente, em Portugal para fomentar o poder do design para futuros desejáveis.
Ela tem mais de 10.000 horas trabalhando próximo aos clientes em design de facilitação, liderando uma ampla gama de projetos em setores como saúde, finanças, educação, varejo, notícias, tecnologia e bens de consumo.
Juliana fala sobre o poder do design para criar futuros desejáveis. Ela falou em eventos como o Global Innovation Summit em San Jose, Califórnia, TEDxMaua em São Paulo, Brasil, What Design Can Do e o Sydney Design Festival.